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DECLARAÇÃO DA ARTISTA

Quando entro num local abandonado, atravesso um portal do tempo e o mundo lá fora deixa de existir. Os sentidos são inundados com cheiros, cores, luzes e sombras. Toco as texturas ao meu redor com a ponta dos dedos. No silêncio, consigo imaginar os antigos ocupantes no seu dia a dia e experimento emoções de alegria, tristeza e saudade.

É com a sensibilidade assim carregada que pego na câmara e começo a captar imagens em busca da alma daqueles espaços. Alguns locais dão arrepios e uma urgência de sair, mas, na maioria das vezes, sinto-me abençoada por ali estar. Sinto como se tivesse entrado num set de um filme e fosse-me permitido circular por ali - a tentar descobrir o guião-, enquanto os atores estão fora na pausa do almoço.

Quem eram estas pessoas? O que vestiam? O que comiam e bebiam? Onde dormiam e quem amavam? O que temiam eles e com o que sonhavam?

São as respostas infinitas que me arrastam para dentro das suas histórias e eu não consigo evitar apaixonar-me por todas elas.

Muitos dos locais que tive a sorte e a felicidade de visitar, já não existem. Alguns arderam em fogos violentos, alguns foram demolidos para construir algo novo - livre de histórias antigas-, alguns cederam sob o peso do tempo e já não podem ser apreciados. Estes lugares e coisas e histórias irão, todos, desaparecer um dia. Mas, quando eu saio desses lugares com a minha alma e a minha câmara cheias de imagens mágicas, o meu coração é invadido pela alegria de saber que essas histórias continuarão a existir.

Sempre que passo ao largo de um local abandonado, o meu coração salta uma batida ao sentir o seu chamamento, qual canto de sereia. Uma vez que isto lhe aconteça a si, ficará para sempre condenado ao desejo de encontrar o próximo lugar que o arrastará - para dentro dA história que quer ser contada.

                                                                                                                        Mafalda Marques

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